sábado, 5 de dezembro de 2015

Oitavo

Sob o escandalizar da protuberância de Isaque, ele é inundado pelo plasma. O peso do material é maior do que ele pode aguentar. Ironicamente, aquele oceano, que o transformara, dera-lhe uma nova vida, agora, sufocava-o. Não estranhamente estaria ele a cobrar a energia gasta, a vida cedida. O plasma começou a aumentar o volume rapidamente. Ficava agitado e suas ondas atingiam quase nove metros de altura. De amarelado, o líquido ganhava uma tonalidade lilás, assemelhando-se à cor do bico da criança. Isaque era atingido pela força e chicoteava nas paredes daquele andar.  Ao longe, escutava-se algum barulho diferente do impacto do corpo nos obstáculos. Fazia-se um som semelhante ao produzido pelo bico, porém grosso, pesado, fétido, desesperado. Uma grande criatura se aproximava. Encontrava-se apenas naquelas águas. Seus músculos eram procurados pelos navegantes, seu óleo aproveitado para produzir chuvas, e seu couro cobiçado pelos ricos. A galinácea azul, algo tanto parecido com uma baleia, de cor lilás frequente, mas que se camuflava diante as variações daquele mar. Em parte frontal, sua cabeça se afunilava em um grande bico azul, repleto de cerdas, que usava para captar os alimentos. Ela viera atrás do chamado, um filhote, um descendente seu. Ela se aproximava pesadamente, corpulenta, a remexer todo o oceano num raio de quilômetros.
Finalmente consigo me segurar no lustre de um apartamento. Não entendo direito o que ocorrera. Sinto grandes dores pelo corpo e uma enxaqueca que perdura uma infinidade. Talvez seja melhor deixar-me ir, deixar minha dor ser embalada pela violência dessas águas, deixar-me afundar nesse espesso oceano. Finalmente deixar minha alma ser lavada e levada dessas dores. Os dedos do menino seguram firmemente o pedúnculo do lustre, como em suplício por sua vida, mas o desespero do garoto é maior e sua mente envia o desejo de livrar-se. Que assim seja, amém! Sou arrastado pelas....................... A galinácea azul passava rente ao garoto e sua longa cauda, repleta de penas e escamas, atinge impetuosamente a face do garoto, que, inconsciente já, atravessa a janela de ferro fundido no fundo daquele apartamento. A criatura segue sua cria.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Séptimo

Tudo passava em turbilhão. Eu não sentia o meu corpo, mas tinha a impressão que ele viajava em alta velocidade. Estava sob uma pressão enorme. Imaginava que logo iria ceder, eu seria pulverizado diante tamanha força. Estranhamente, a única coisa que sentia era um formigamento mui incomodo em minha perna. Acho que era devido a saída do veneno. Creio que estou vivo, para a decepção daqueles que tentaram me matar. Por muito tempo senti um frio mortal, como se minha vida fluísse e levasse junto todo meu calor. Mas, recentemente, um grande fogo tem se apoderado de mim, tenho certeza que um termômetro marcaria mais de 140° C. Tenho me sentido muito sozinho, Ele não aparece há dias. Sinto a presença dEle em alguns instantes, mas não consigo abrir os olhos para confirmar. Eu não sinto o meu corpo, não consigo me mexer, não consigo ver, sinto muito calor. Onde estou? Evito pensar que, na verdade, parece que estou morrendo.
Os raios de luz ricocheteavam por todo o andar. Não se via mais nenhum marinheiro a se aventurar naquelas águas naquele período depois da tragédia. Algumas aves uninucleadas que se atreviam a penetrar naquela região e eram atingidas pelos raios acabavam calcificadas e mergulhavam em peso, adentrando o plasma. Já as aves binucleadas ardiam sob o fogo, liberando uma fumaça verde espessa. As mais raras, as polinucleadas morriam asfixiadas com a fumaça, igual aos navegantes. A luminosidade aumentava rapidamente, as bolhas aumentavam de tamanho, mas diminuía em quantidade. Grandes rachaduras cruzam aquela massa espessa que envolvia o menino. Por um segundo, tudo aquieta-se, não há mais luz, não mais produção de nada. Algum tempo de passa e, estranhamente, o volume do plasma começa a diminuir, especialmente na região onde o garoto se encontrava. Logo a cápsula encosta no chão, ilhada. Um som abafado é produzido. Alguns diriam que fora uma nota errada no piano do vizinho do andar de baixo. Uma violenta explosão acompanha o dissipar do som, pesados raios de luz violeta correm sobre e por dentro do plasma, afundando e quebrando em contato com o chão, produzindo grandes crateras no andar. Depois que uma grande massa de fumaça verde se dissipa, pode-se ver a cápsula quebrada com uma estranha forma em seu centro. Penas branco-musguentas recobriam o abdome da coisa e uma grande pata com três dedos estendia-se ao lado da perna. Aos poucos ele acordava. Aos poucos, Isaque tomava consciência novamente. No local dos cortes na barriga e nos braços, alvas penas cresciam, igualmente na perna. No entanto, nesta, uma estrutura escamosa, fina, comprida, com unhas gigantescas, preenchia o local do membro necrosado. Em sua testa, uma pequena elevação aparecia e devagar, ganhava a forma de um bico pontiagudo e queratinoso, de cor violeta. Sob aquele silêncio, a estrutura emitiu um grunhido pela testa do menino e o plasma, violentamente, voltou a preencher o cômodo. 

Sexto

Grandes bolhas começaram a se formar ao redor da cápsula que envolvia o menino. Elas se iniciavam ao seu redor e subiam pesadamente à superfície, demonstrando a densidade daquele plasma. Ao se abrirem, as bolhas liberavam um gás áspero e marrom, que se dispersava no espaço acima daquele oceano. A cápsula dissolvia-se. Pequenas rachaduras apareceram, permitindo que pequenos raios de luz atravessassem e perambulassem pelo plasma, refletindo e marcando os cristais daquela substância. Alguns navegadores se arriscavam pelo local naquele momento. Os que não usavam máscara se retiraram diante a liberação de gases o que, em realidade, era normal acontecer. Os mais experientes usavam máscaras 5D de carvão heólico, protegendo-se. Foram atraídos pela luminosidade emitida pelo menino e lançaram grandes redes de pesca para capturarem a fonte daquela emanação. Oh, leitor, quão ignorantes demonstravam ser esses tais pescadores dessas estranhas águas. Quem pescaria em um mar nauseabundo, denso, que emana gases amarronzados e, agora, espessos raios de luz. Seria sensato? Não. Pois que morram os infelizes. Diziam-se experientes, mas não souberam reconhecer os perigos daquela nova manifestação. Os raios, em contato com o material da rede, começaram a incendiá-lo, e, logo, sobre a superfície, as embarcações também começavam a serem consumidas pelo fogo. O gás marrom não se misturava ao gás verde do fogo. Todos que ali estavam sabiam do risco de pescar naquele espaço e sabiam que não conseguiriam sair dali. Os gases, densos, proibiam a vista de observar o que acontecia. Os raios de luz atingiam os olhos desatentos. Ouviam-se apenas os gritos, sentia-se o desespero dos viajantes que eram atirados e atiravam-se sobre aquele líquido. Abaixo da superfície, podia-se ver os corpos se contorcendo até atingirem o fundo. Eram consumidos pouco a pouco e logo se transformariam naquilo que vieram buscar, tesouro. Quem é esse tal narrador? Qual narrador é impossibilitado de ver o que acontece em algum lugar? Relembremos, leitor, ao nosso escritor, as características de um narrador em terceira pessoa. Assim, visto sua incompetência em escrever corretamente, venho completá-lo.  Aquele fogo provocado pela luz percorria as cordas, liberando uma fumaça esverdeada tóxica, dificultando a respiração de todos, mesmo com a proteção. Aquela fumaça específica requeria uma máscara 11D com carvão xenoniano. O verde acumulava-se embaixo, enquanto o marrom suspendia-se, obrigando os marinheiros ao contanto com o mais tóxico. Alguns desesperavam-se e se atiravam no plasma, tentando encurtar o sofrimento. Aqueles que se permitiram lutar pela vida, demonstrava grande conhecimento em dança contemporânea, debatendo-se e vociferando contra as vontades divinas (do escritor!). Os que retiravam as máscaras, tentando mais uma golfada de ar, permitiam que o gás reagisse com a mucosa da boca, produzindo uma saliva espessa e avermelhada, impedindo que respirassem daquela forma. Logo, todos aqueles infelizes navegantes encontravam-se mortos. Enquanto tudo aquilo acontecia na superfície, a capsula continuava a se desfazer, emitindo bolhas e grandes raios de luz.

Quinto

Não se observava o respirar. Não se sentia o pensamento. No centro do ambiente via-se apenas uma massa disforme a repousar a alguns centímetros do chão, a flutuar em líquido espesso e amarelado. O corpo atingia três vezes o tamanho anterior, volumoso. A face irreconhecível, não identificaria a outrora criança que o habitava.  Da perna, já nada escorria. Já não havia perna. Já não se reconheciam os membros, apenas uma grande oval suspensa opaca e fétida. O plasma inundava todo o andar. Espesso e nauseabundo, era secretado pelas paredes. Por hora, apresentava-se esverdeado, outras, amarelado, lilás, azul. Por dias, agitava-se, como o mar, e ondas colossais se espalhavam pelos apartamentos, carregando, destruindo, desmanchando. Por outros tempos dormia, aquietava-se, e diminuía seu volume. Em segundos, tremores e avalanches tomavam o andar. Não se aventuravam em suas agitações aqueles não experientes. Poucos sobreviviam ao seu rancor. Os barcos abriam sulcos em sua forma, excitando sua animosidade. Durante alguns períodos, sua produção era menor, e o líquido condensava-se em pequenos cristais, material altamente nutritivo e valioso em tempos de crise como aquela. Alguns atreviam-se a perturbá-lo, no entanto, muitos, em realidade, apenas contribuíam cedendo os próprios corpos a constituição daquele oceano denso. O tempo corria enquanto o menino permanecia inerte. Percebia-se que, aos poucos, algo como uma camada forma-se ao redor dele, algo depositava-se, formando uma área densa, uma cápsula. Apesar do peso da criança e a formação desse novo material a sua volta, o menino continuava a flutuar sobre o piso. Mesmo com as reviravoltas e tremores do plasma, ele permanecia imóvel. O material ao tempo já se condensava impedindo analisar o garoto, como a sussurrar sua posse sobre mais aquela vida. Parecia-nos ausência. Aqui está meu altar, filho, deite-se sobre a lenha.